8 de dezembro de 2010

Fenômenos da natureza

               

               Primeiro, ao estender canga e cadeira, o azul daquele céu era limpo, um azul forte e otimista, lembrando que o último dia do pior dos anos, vinha com um toque de blues, um azul feliz e desejável, constante nesses dias em que chuva e sol se alternam num teatro de fantoches vulneráveis.
              Óculos no rosto, música alta, e olhos fechados. Não acredito mais em ano novo, penso. Lamentável, porém  palpável. Quase real, se sólido fosse e forma obtivesse. Ano novo agora é uma data para encher as pessoas de sonhos mirabolantes, promessas falsas e que em sua maioria não serão cumpridas e fazer as pazes, seja com quem for. Até mesmo aquele que, a uns dias da escassez desses trezentos-e-sessenta-e-cinco dias insuportáveis, faz toda a sua mente travar e o seu corpo, víceras e sono, coração; perde o chão, a alma e o sentido. Escuto Engenheiros do Hawaii e canto alto Infinita Highway...Principalmente na parte em que a vida é tão confusa quanto a América Central, e que não me acusem de ser irracional. Singular. Exato, perfeito o que sinto no momento. Tiro o óculos, que me marca o rosto, desfazendo-me também da máscara colorida a qual vinha enxergando o mundo ao contrário, colorido como passeata gay e, olho as nuvens.
                As nuvens refletem o que nos é real, e seguem vagando, fluindo em meio aos ventos, às transformações urbanas, ilhas de calor. Mas transfiguram suas formas, em segundos, e muitas vezes, depois lá no final, outra pessoa a vê, do mesmo formato que você: elas tem a chance de voltar a ser como já foram, se reconstituir. Muito mais identificável. E olho atentamente, observo uma como um palhaço, outra nomeio de cobra e a lua também dá os ares, vezenquando, deixando transmutar suas nuances, noutras escondendo-se, tímida. A lua sim, me apaixona e enfeitiça. É uma louca apaixonada, que vê seu amor poucos segundos por dia, e continua solitária, no escuro, raindo para outros apaixonados; por ela, e sobre ela.
                Algo incomum surge. Eu observando, pensando na vida, e cantando alto as músicas dor-de-cotovelo antigas, mais trashs e anos oitenta que tenho, e um colorido me salta aos olhos. As nuvens tomam cor. Tudo lindo, num dia só: nuvem, lua e arco-íris. Eram umas nuvens meio pintadas, mas somente nas bordas, azul amarelo verde roxo e rosa. Lindo de se ver. Ótimo para pensar, nessa minha vida insignificante e na minha natureza paradoxal.
              Acompanhei por tais instantes esse espetáculo de fenômenos da natureza, e senti um feeling bom, uma coisa nascendo e aflorando, não quero chamar de esperança, tenho medo que se chame comodidade ou aceitação. Prefiro fé. Fé de que tudo isso vai melhorar algum dia, nesses nossos próximos trezentos e poucos, mesmo que à frente, luz nenhuma seja visível. Porque, mesmo que a gente tenha fé, não é aquele sofrimento ansioso de esperança, que se parece mais com pena ou loucura. Não. Na fé, é tudo com muita calma, aliás: a certeza é tão forte, que não há rapidez em viver. Depois disso tudo, o tempo fechou, tocou o relógio: meio dia. Hora de sair do câncer de pele futuro (e do câncer de alma, completamente mais perigoso e voraz).


Camila Paier

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