14 de outubro de 2010

Se fosse amor


Não era o que queríamos que fosse. E muito menos foi, o que desejávamos que se torna-se. Luxúria, versus sentimento. Corpo contra coração. Nenhum vencedor, de algumas batalhas, e inúmeras afrontas. Por esta razão, onde nos encontramos no mundo e nos perdemos na vida, atesto: não era amor. Não tinha vocação para este volver; nenhuma. Era muita vontade de um lado, contra desmerecimento do outro. Um caso, contra um descaso inteiro. Enganou por certo tempo, mas podendo avaliar melhor, de longe e com olhar crítico, tenho cada vez mais certeza: foi uma ilusão. Um amontoado de desculpas esfarrapadas, colocadas no lugar mais alto do pódio. Uma patologia. Uma eterna confusão. Porque se fosse realmente amor, nada disso seria em vão.
Se fosse amor, não teria planos descabidos, e promessas quebradas. Não caberia casualidade, e sim, uma dose nobre de veracidade. Manhãs despertadas com beijos despudorados, e vontades pré-aquecidas. Almoços de última hora, e lampejos de idéias fantásticas, teses descobertas, e movimento constante. Emoção intensa, e não paralisia corriqueira. Pique-niques no parque, silêncios confortáveis e surpresas no final do dia, seriam inevitáveis. Infelizmente, afeição é muito mais do que apenas ligações oportunas, e noites quentes; medo de descobrir o outro tão à fundo, e esquecer o caminho de volta à si mesmo. Afeto tem muito mais a ver com dois telefones desligados, e um mundo próprio em conjunto, sendo criado dia após dia, sem longas esperas e sumiços efêmeros. Com muita vontade, e compartilhamento de vidas. Alguns mistérios, pra não ficar demasiado corriqueiro. Gentilezas sob o pé da cama, e uma flor atrás da orelha. Admiração mútua, e conversas intermináveis; com algumas pausas, frases pela metade e palavras de conforto e carinho. Seria o tempo bem aproveitado, e batalhas apoiadas um pelo outro. Metas traçadas, e atitudes em prática. Cada qual com seu caminho, porém com apoio incondicional; duplo e dulcificante. Amor é dois, e não um. Nunca três. Duo, e não trio. Nós, e não eles.
Se fosse amor, haveria integridade. Segurança. Cumplicidade. Quando na verdade, tudo não bastava de um sonho; algumas palavras bonitas, e momentos antes únicos. Sorrisos singelos, e que na verdade, escondiam todo um mundo de meias-verdades, de mistérios desenfreados, agora então arejados. Acharíamos um charme, todo e qualquer pequeno defeito - que era assim chamado, porque amor entre nós não havia. E quando sentimento não há, falhas são apenas falhas; defeituosas e abismais.  Talvez se as afinidades fossem maiores, o coração talvez acordasse. O meu tão grande, e apressado, correndo contra o tempo. O seu tão clandestino e amoral; diminuto. Desiguais, e ainda assim, desacordados. Desencaixados. Simplesmente porque de amor, essa história não tinha nada. Apenas uma saudade que perdurava aqui, e não ecoava aí, do seu lado de ilha solitária, que é a vida cabalística a que nos submetemos.
Não foi amor. Foi uma hombridade esquecida, uma homogeneidade inexistente, uma angústia ambulante. Algumas corridas de táxi, e um brio acelerado. Um ritmo nunca acertado, notas desordenadas e descompostas. Apenas uma alergia à completude e um temor da felicidade. Uma fuga antes do tempo exato. Muitas palavras, quando o melhor era sair com a cabeça erguida (mesmo quente), e a boca cerrada. Erros, não só de execução, como de partida. Anomalias amáveis, e um crime irresistível de não cometer. Vontade de acertar, e pouca força para alcançar o topo, o feito. Desatino. Se fosse amor, obrigatoriamente, singular seria. Porque não é, e esperei que fosse. Que houvesse no mínimo coragem, ou alguma força maior por trás dessa adrenalina toda, para transformar. Paixão, quem sabe. Paz, não vi. Sair do que não existiu, deixa sempre a pulga atrás da orelha, de como seria se tivesse então deslanchado. O que vale é se lembrar sempre, e cada vez mais que, se não aconteceu, teve motivos suficientes para ficar adormecido. Que assim seja, e as lembranças boas não se percam por entre dias frívolos e cinzentos; perpetuem apenas na memória, e acrescentem como aprendizado.

Camila P.

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